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segunda-feira, 10 de junho de 2013

A corrupção dos outros - por Bruno Leal

If a country is to be corruption free and become a nation of beautiful minds, I strongly feel there are three key societal members who can make a difference. They are the father, the mother and the teacher.

Abdul Kalam

Todos criticamos a corrupção; todos detestamos gente corrupta; todos nós achamos que as nossas instituições políticas e democráticas estão cheias de gente corrupta. Bem, alguns de nós criticam mais do que outros, é verdade. De acordo com o Corruption Perceptions Index 2012, publicado pela Transparency International, que faz o ranking dos países de acordo com a forma como o seu sector público é visto em termos de corrupção, a população de países como a Dinamarca, a Finlândia ou a Nova Zelândia tem uma imagem muito mais positiva das suas instituições do que quem habita na Somália, Coreia do Norte ou Afeganistão. Mesmo entre países do chamado Primeiro Mundo existem algumas diferenças. Mas a verdade é que todos nós criticamos a corrupção, todos afirmamos que está errada e que deveria ser combatida, todos tendemos a apontar o dedo aos nossos políticos ou a quem ocupa cargos públicos e a dizer que ELES são corruptos.


E NÓS? Seríamos melhores que eles? Somos imunes à corrupção? Na nossa vida quotidiana somos 100% honestos em tudo o que fazemos?

De facto, de cada vez que fazemos download ilegal de música, de cada vez que «metemos uma cunha» para colocar os nossos filhos na escola que queremos ou para garantir emprego a um amigo, de cada vez que tentamos fugir aos impostos, todos estamos a fazer algo que é, de certa forma, condenável e todos estamos a fazer algo muito semelhante àquilo por que condenamos os outros.

Há investigações científicas que demonstram que as pessoas são capazes de agir de forma desonesta o suficiente para beneficiarem disso, mas que o fazem até um determinado limite, de modo a preservar a noção de se sentirem pessoas honestas. Ou seja, mentimos e «fazemos batota» em pequenas coisas, mas fazemo-lo de forma a preservar a noção que temos de nós próprios (Mazar, Amir, Ariely; 2008). Fazemo-lo racionalizando ou tentando reconstruir e adaptar os motivos por trás do nosso comportamento (Von Hippel, Trivers; 2011), criando categorizações para as nossas acções de forma a que consigamos caracterizar os nossos actos menos honestos de uma forma mais compatível com as nossas noções de moralidade e honestidade. Para além disso, somos mais susceptíveis de actuar de modo desonesto quando temos consciência ou achamos que os outros também o fazem (Mazar, Amir, Ariely; 2008). Bem, de facto, tal é verdade, mas apenas de um modo parcial: temos menos problemas de consciência em fazê-lo quando sabemos que há outros como nós – pessoas do mesmo grupo que nós, na mesma situação que nós – que o fazem, mas acontece o oposto quando a desonestidade é praticada por pessoas com quem não nos identificamos ou de quem não gostamos (Gino, Ayal, Ariely; 2009). Talvez isso signifique que a ideia popular de que todos os políticos são corruptos transporte consigo alguma verdade. Afinal de contas, talvez um novo político, se vir que todos os políticos desviam dinheiro, ache menos condenável fazê-lo também. Mas também significa que, provavelmente, se nós estivéssemos na posição de alguns políticos, também seríamos corruptos. Também significa que, se uma parte substancial da população foge aos impostos, esse acto é, em si, aceite como comum e até normal, tornando-se menos imoral, e talvez a restante população esteja mais susceptível a fazê-lo, usando essa aceitação social do acto desonesto como uma forma de racionalizar a nossa própria atitude.

Será que somos melhores que os nossos políticos? De onde vêm os políticos corruptos ou os empresários desonestos – aqueles que tanto criticamos? Vêm da nossa sociedade. De um modo geral – e, obviamente uns mais que outros (Yang et al; 2005) – todos somos corruptos. Deste modo, o problema não está na desonestidade da política, mas sim na desonestidade da sociedade em geral.

Assim sendo, a grande questão que se coloca é: de que modo poderemos alterar a nossa sociedade para que não seja intrinsecamente corrupta?

Diversos estudos demonstram também que criar leis mais severas ou aplicar as leis existentes de forma mais dura dificilmente é solução para o problema. Era crença generalizada dos modelos socioeconómicos mainstream, que a decisão para agir de forma desonesta dependia de um processo de avaliação entre o que se espera ganhar com esse acto, a possibilidade de ser apanhado, e a magnitude do castigo por ser apanhado. No entanto, hoje em dia sabe-se que essa é uma ideia errada e de que é bem mais complexo que isso (Mazar, Amir, Ariely; 2008).

Hoje sabe-se também que a melhor forma de combater a corrupção será através da educação e da consciencialização de toda a gente; através de educação contra a corrupção para os jovens, nas salas de aula e fora delas; através de campanhas de sensibilização para toda a população. De facto, se olharmos para os países que estão listados no Corruption Perceptions Index como sendo aqueles em que a percepção de corrupção no sector público é menor, facilmente conseguimos identificar muitos deles como países onde existe uma nível mais elevado de educação e de responsabilidade cívica. A educação e a consciencialização parecem ser as melhores formas de pôr travão à corrupção, ou de pelo menos a reduzir (Keen; 2000). Demora tempo e é necessária muita paciência. É uma verdade dura. Mas todas as evidências apontam para que esse seja o caminho certo.

Mas até que o problema seja resolvido, há formas de o ir mitigando. Também existem investigações que demonstram que é possível diminuir o nível de desonestidade através da chamada de atenção e da recordatória para os valores que regem o comportamento honesto, sejam eles morais, religiosos ou de compromisso. (Mazar, Amir, Ariely; 2008). Assim, enquanto a educação anti-corrupção for, lentamente, operando os seus efeitos, talvez o nível de corrupção possa ser diminuído apostando em campanhas que relembrem as pessoas dos valores éticos e morais. Tal pode ser feito, de uma forma pouco específica mas com alcance mais vasto – através dos meios de comunicação social ou de cartazes e outdoors – ou em momentos específicos em que as pessoas estão mais sujeitas a agir incorrectamente – através de notas que relembrem princípios morais ou a obrigatoriedade de assinar compromissos de honra quando as pessoas estão a declarar os seus impostos, a visitar sites de downloads ilegais (ou a pesquisar por eles), ou quando profissionais estão a desempenhar tarefas que sejam susceptíveis de batota e corrupção. Imaginemos um parlamento, um palácio presidencial ou uma câmara municipal decorada com slogans que promovam a honestidade e combatam a corrupção. Está provado cientificamente que o simples acto de chamar a atenção das pessoas para os seus próprios padrões morais pode ser eficaz (Mazar, Amir, Ariely; 2008). E, mesmo que não seja, de certeza que tais locais públicos ficarão bem decorados.

Em resumo, é bom que continuemos a criticar a corrupção, a desonestidade, a ilegalidade. Mas temos de ter consciência de que quem pratica esses actos emerge da mesma sociedade onde vivemos e onde, muitas vezes, agimos também de forma desonesta, mesmo que em pequenas coisas. Temos também de estar cientes de que só mudando as mentalidades teremos efeitos a longo prazo; e que isso se consegue passo a passo.

Nota: este excelente texto da autoria de Bruno Leal, criado para o seu blogue [Notas Pensadas], refere na perfeição os princípios e objectivos em que assem este movimento, por isso foi indispensável e imperativo fazermos aqui a sua divulgação.

Fontes bibliográficas

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Sobre A Economia Paralela

O que é a economia paralela?
O termo “economia paralela” nasceu em 1947, através da criação, pelas Nações Unidas, do primeiro documento institucional que iria conduzir à organização das contabilidades nacionais dos diferentes países. Devido à importância da organização político-económica, havia uma necessidade de identificar as actividades económicas marginais, sendo então designada a “economia não registada” ou economia paralela.
A economia paralela consiste na prática de actividades económicas que não são declaradas ao Estado e, desta forma, carecem de tributação. Tal facto não significa que tudo o que consiste em economia paralela é ilegal. Os actos ilícitos associados a esta prática são, por exemplo, a prostituição, o tráfico de droga, o tráfico de armas ou a prática de jogos ilícitos. Isto porque o simples facto de passar uma factura, não é, até ao momento da execução do Orçamento de Estado 2013, uma prática obrigatória e associável a toda e qualquer cobrança, derivada de actividades produzidas e comercializadas. Outras práticas, como por exemplo, a agricultura de subsistência ou serviços trocados entre familiares, apesar de representarem formas de economia paralela, não consistem em ilegalidades.
A economia paralela é de facto um fenómeno que deve ser estudado sob o ponto de vista comportamental dos cidadãos, que tem implicações directas nas sociedades, alterando os indicadores económicos e dividindo-se em práticas criminosas, irregulares e domésticas ou informais. Engloba, portanto, a fraude, o branqueamento de capitais, a desregulação do Estado, os crimes de colarinho branco, e associada à globalização, influencia positivamente a criação de redes criminosas internacionais.
Mais do que um problema técnico, a economia paralela deve ser encarada como um problema social, que influencia directamente o desenvolvimento e maturidade de uma Democracia. Apesar de cada um de nós ter uma quota-parte de responsabilidade no desenvolvimento e crescimento da economia paralela, é importante que a culpabilização não seja essencialmente focada na passagem de facturas, mas substancialmente nas grandes e corruptas negociatas derivadas de abuso de poder e nas fugas ao pagamento de impostos onde a riqueza se criou, através de offshores, legitimadas pelos Estados.

Como quantificar a economia paralela?
A quantificação da economia paralela deve obedecer aos critérios presentes na publicação da OCDE de 2002, “Measuring the Non-Observed Economy – A Handbook”. De um modo geral, tal processo, consiste numa análise estatística que se separa nas diferentes formas de economia paralela acima citadas (práticas criminosas, irregulares e domésticas). Assim sendo, normalmente, utilizam-se como amostras: auditorias e acções policiais, resultados de inquéritos, estimativas em relação à contabilidade da moeda em circulação e até os gastos energéticos das empresas, entre outros factores. Como qualquer análise estatística, a precisão nunca é total, existindo sempre mais parâmetros passíveis de serem estudados ou até, erros provocados pela própria amostra. A quantificação da economia paralela, que deriva de situações criminosas como o tráfico humano, de animais, droga ou armas é a mais difícil de obter.

Causas para a existência da Economia Paralela
Os principais motivos para a existência da Economia Paralela prendem-se, sobretudo, com a existência de taxas elevadas (incentivadoras da evasão fiscal) e contribuições para a segurança social. Num segundo plano, temos ainda um conjunto de restrições e regulamentações a obedecer, impostas através de legislação, no sentido de regular a actividade económica, como por exemplo, salários mínimos, limites horários ou regras de segurança e saúde. Além disto, o valor da inflação, ao longo dos anos, não se tem traduzido no aumento dos salários e pensões, bem como não foi ainda construída uma relação de confiança entre Estado e cidadãos, que estimule a crença numa correcta aplicação dos impostos, por parte do Governo.

Uma das principais causas de vários ciclos migratórios, revoltas e revoluções, foi a reacção pública à aplicação de injustiças fiscais. A evasão fiscal é uma forma moderna de resistência passiva e uma expressão de hostilidade.” Dan Bawly



Segundo a curva de Laffer, existe um determinado nível para o aumento dos impostos, o qual, quando excedido, reduz a receita do Estado. Este facto não só se deve ao fraco incentivo que os cidadãos têm para consumir e consequentemente manter/aumentar a produção da economia. Deve-se também a um acréscimo da economia paralela.

Implicações da Economia Paralela na Sociedade
A economia paralela é difícil de quantificar, no entanto, segundo vários estudos, entre os quais a investigação do Observatório de Economia e Gestão de Fraude da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, a economia paralela representa hoje cerca de 24% do PIB, ou seja, da economia real. A relevância deste valor e a sua implicação danosa para a sociedade portuguesa é fácil de comprovar – representa cerca de 78% do nosso défice público – o que por si só, mostra que a ausência de economia paralela, poderia não só colocar a economia real a crescer, bem como a diminuição dos impostos e a sucessiva criação de emprego, estimulado pelo aumento da produção e consumo. Em Portugal existe ainda um longo caminho a percorrer no combate à economia paralela, sendo que, o nosso país, encontra-se ainda longe da média da OCDE – cerca de 9%.

Evolução da Economia Paralela em Portugal


Formas de combater a Economia Paralela
  • Formação Cívica no Ensino Obrigatório
  • Formações e ações de consciencialização, gratuitas, de ética no Ensino Superior;
  • Uniformização das facturas a nível Europeu (combatendo as facturas falsas);
  • Acabar com as offshores;
  • Arrecadação de receitas sob actividades económicas não registadas como a prostituição e as drogas leves;
  • Optimização do sistema judicial;
  • Redução dos impostos e aumento da fiscalização;
  • Aumento da flexibilidade legislativa (redução do número de leis e exigências regulamentares).

Material de apoio

Autor: André Lopes
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